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03.02.2021 – Ler Machado de Assis não é fácil

 

Machado de Assis é o maior escritor que o Brasil já teve. Trata-se de um consenso bastante sólido na cultura brasileira. Mas, como nada no Brasil é simples e corriqueiro, ele não é leitura que se abre generosa aos que dele se aproximam. Ler Machado é uma conquista árdua que exige grande trabalho. Ele próprio tinha ciência dessa dificuldade, pois escreveu em Memórias Póstumas de Brás Cubas:

“Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente consternará é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinqüenta, nem vinte e, quando muito, dez. Dez? Talvez cinco.”

Difícil ou não, sua importância na literatura brasileira só faz crescer com os anos, e sim, ele tem presença obrigatória no currículo escolar dos brasileiros, porque todos têm de conhecer a cultura de seu país. Como na superfície nossa vida cultural está infestada de estereótipos, faz-se necessário saber dos veios do minério de real valor.

A dificuldade de leitura da obra de Machado já rendeu muita polêmica. Além de pessoas sem bagagem cultural chegarem a pensar em tirá-lo do currículo escolar, houve quem apresentasse a sugestão de reescrever textos de Machado com linguagem mais moderna para facilitar a leitura. Uma ideia falha por se apoiar num falso diagnóstico. A linguagem de Machado é do século XIX, mas coloquial. Apesar de alguns termos em desuso, a compreensão flui pelas palavras. O máximo que se poderia fazer é um glossário dos termos antiquados, mas várias gerações leram Machado sem sentir essa necessidade. Estaria o problema nos jovens atuais que querem tudo mastigado, sem disposição para qualquer trabalho mais duro?

Embora isso possa ter um grão de verdade, não dá para negar que existe uma barreira real na leitura das obras de Machado de Assis. Não é um escritor fácil. A dificuldade não está na linguagem, mas na sua visão de mundo que requer maturidade e experiência de vida para começar a ser entrevista.  E existe ainda o agravante de Machado usar a ironia como seu recurso de linguagem preferido. Uma pintura com as tintas da ironia não resulta clara nem nítida. A luz que a revela é oblíqua.

Com base na minha própria experiência, considero bastante difícil que jovens compreendam Machado de Assis. O que ele apresenta não é agradável, antes muito amargo. Os jovens não apreciam esse travo. Mas isso não implica que a leitura de Machado de Assis deva desaparecer nas escolas. Pelo contrário. Seja qual for a resposta de cada um a essa experiência de leitura, terá sido um passo importante na sua percepção de nossa cultura.

Nós brasileiros temos de aceitar que somos um país peculiar, diferente. Nosso maior escritor trilhou caminho acidentado e pedregoso, mas isso não é motivo para deixar de acompanhá-lo na sua busca.     

 

 

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