Um bando de íbis?
Lillian Meyer
O processo criativo nas crianças está em sua forma essencial: sem o gesso dos freios inibitórios, das influências calculadas, dos bloqueios dos pensamentos viciados. O João, de 5 anos, e o Pedro, de 3, ensinam essa lição diariamente, com gentileza e de forma absolutamente involuntária. A palavra dos pequenos está em seu formato e peso exatos. A observação que fazem do mundo que se apresenta é sutil, grata às novidades e surpresas. Tudo é muito espontâneo e organicamente visceral. As censuras e os moldes da palavra falada vão podando essa naturalidade de expressão à medida que o diálogo vai se tornando um importante balizador do bem estar social. Lamentavelmente, essa adaptação – fundamental – da fala se reflete na escrita que possa vir a se desenvolver. A essência fica mascarada. Estilo, técnica e refinamentos são as ferramentas que nós, adultos, temos para resgatar esse estado de pureza essencial do significado. E, ainda assim, quase sempre ficamos longe, longe, longe do nosso objetivo. A sensibilidade, sem dúvida, é infantil.
Juliana Eichenberg
A condensação e a dissolução do Qi são para o Vazio supremo aquilo que o gelo e o derretimento são para a água. Compreender que o Vazio supremo é o Qi é compreender que não existe o não-há. O há e o não-há são aspectos do Qi concentrado e dispersos. O Qi é a realidade última que permeia o manifesto e o imanifesto.”
Estevam Ribeiro
As crianças de nossos dias recebem uma carga de informações muito superior à de décadas atrás, o que nos leva muitas vezes a reagir espantados diante de seu desenvolvimento acelerado. Mas, como em toda e qualquer época, permanece extraordinário o seu potencial para aprender e compreender as coisas, e elas continuam a elaborar modos surpreendentes de entender o mundo. Os filhos pequenos da minha afilhada queriam saber o que eu fazia, o que era ser tradutora. Ela lhes explicou com carinho o meu ofício e acabou escutando de um deles: “Ah, já entendi. Ela ensina os personagens a falar português.” Ai, João, nem imaginas como é difícil dar essas aulas para os personagens. Eles vivem fazendo uma bagunça danada, numa algazarra incrível, uns embirram e nem querem abrir a boca, outros fazem de conta que entendem, mas começam a dar risinhos e a falar tudo errado, e ainda outros berram a mais não poder para ninguém compreender o que estão dizendo. Porém, no meio dessa verdadeira batalha, acontece às vezes que um deles, com a cara mais deslavada, começa a falar frases perfeitas, coloridas, sem erros, e a expressão de seu rosto diz muito claramente: lógico que sei falar a língua, essa professora pensa que não sabemos, mas é que ela custa a entender as coisas.
Rosaura Eichenberg