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[14 de outubro de 1922 – Paris]

Meu espírito está quase morto. Minha fonte de vida, tão faminta que secou. Quase todas as minhas melhoras de saúde são pura farsa – teatro. Que significam? Posso caminhar? Apenas me arrastar. Posso fazer qualquer coisa com as mãos e o corpo? Nada. Sou uma inválida sem esperança alguma. O que é a minha vida? A existência de uma parasita. Cinco anos já se passaram, e estou num cativeiro mais estreito que nunca.

*

 Portanto, se o Grande Lama do Tibete prometeu ajudar – como pode hesitar? Arrisque! Arrisque tudo! Não dê importância às opiniões dos outros, àquelas vozes. Faça o mais difícil nesta terra para você. Aja por si mesma. Enfrente a verdade.

Certo, Tchekhov não a enfrentou. Sim, mas Tchekhov morreu. E sejamos honestos, o que sabemos de Tchekhov a partir de suas cartas? Isso foi tudo? É claro que não. Não é de supor que ele tenha tido uma vida inteira de desejos sobre a qual dificilmente se encontra uma palavra? Leiam-se as últimas cartas. Ele abriu mão da esperança. Eliminando-se os elementos sentimentais dessas cartas finais, elas são terríveis. Não há mais Tchekhov. A doença o tragou.

Mas talvez, para as pessoas que não estão doentes, tudo isso seja absurdo. Nunca viajaram por essa estrada. Como podem saber onde é que estou? Tanto mais razão para avançar ousadamente, sozinha. A vida não é simples. Apesar de tudo o que dizemos sobre o mistério da Vida, quando chegamos perto, queremos tratá-lo como se fosse um conto infantil…

Mas, Katherine, o que você quer dizer com saúde? E por que você a deseja?

Resposta: Saúde para mim significa poder viver uma vida plena, adulta, viva, de fôlego, em contato íntimo com o que amo – a terra e suas maravilhas – o mar — o sol. Tudo a que nos referimos quando falamos do mundo externo. Quero entrar nele, fazer parte dele, viver nele, aprender com ele, perder tudo o que em mim é superficial e adquirido, e tornar-me um ser humano direto e consciente. Quero, compreendendo a mim mesma, compreender os outros. Quero ser tudo o que sou capaz de me tornar, para que possa ser (e aqui parei e esperei, esperei, mas não adianta – só há uma expressão possível) uma filha do sol. Sobre ajudar os outros, carregar uma luz e assim por diante, parece falso dizer qualquer palavra. Fiquemos com esta filha do sol.

Depois, quero trabalhar. Em quê? Quero viver de modo a trabalhar com as mãos, os sentimentos e o cérebro. Quero um jardim, uma pequena casa, grama, animais, livros, quadros, música. E a partir disso tudo, para exprimi-lo, quero escrever. (Embora possa escrever sobre motoristas de táxi. Não importa.)

Mas uma vida quente, ávida, viva – enraizada na vida – para aprender, desejar saber, sentir, pensar, agir. É o que desejo. Nada menos. É o que tenho de tentar.


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