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09.03.2014 – sobre Macbeth

Em sua biografia de Shakespeare, Will in the World, Stephen Greenblatt informa que a tragédia Macbeth foi escrita em homenagem ao rei James VI da Escócia e I da Inglaterra, quando ele subiu ao trono inglês após a morte da rainha Elizabeth I. Estranha homenagem, pensei, encenar o inferno da consciência de um criminoso para enaltecer a Escócia e seu povo. Greenblatt também diz que James I foi um rei muito culto, tanto assim que reuniu um grupo de eruditos para traduzir a Bíblia, tendo essa tradução, a chamada Bíblia do rei James, contribuído para fixar a língua inglesa. Uma das evidências de seu amplo interesse cultural é que a bruxasmacbethcompanhia teatral a que Shakespeare pertencia, Lord Chamberlain’s Men, passou a se denominar The King’s Men. E outro detalhe a respeito desse rei me chamou a atenção. Diz Greenblatt que o rei James, em que pese toda a sua erudição, interessava-se por feitiçarias, bruxas, superstições, envolvendo-se com esses assuntos a ponto de sentir-se intimidado por eles. Ora, Shakespeare cria sua grande tragédia fazendo uso desses elementos, pois introduz na peça as três bruxas. Entre os espectadores do teatro da época, havia os nobres alojados nos camarotes, enquanto na plateia (no pit – literalmente, no poço) aglomerava-se o povão. Por isso, todas as peças representadas tinham de conter sempre alguns personagens ou temas populares. As bruxas em Macbeth cumprem muito bem esse apelo popular. Shakespeare as utiliza com maestria, como, por exemplo, colocando-as no início da peça para dar aos espectadores todas as informações de praxe (onde e quando se passa a ação, o tema e principais personagens envolvidos – em certas peças, havia até um mestre de cerimônia para instruir o público a esse respeito). A cena é tão magistral que, com dez versos, as bruxas dão conta do recado, além de criar o clima da tragédia. Entretanto, a minha impressão pessoal a respeito das bruxas é de certo modo estranha. Elas sempre me pareceram ridículas, sempre me provocaram o riso. Ou melhor, sempre senti que as bruxas estavam rindo de nós, dos espectadores, como se dissessem: ‘Vocês são na realidade uns otários, uns patetas que ficam pensando que o mal está em nós. Olhem aqui ao nosso lado, se querem realmente saber onde está o mal. Aqui ao nosso lado… Macbeth.’ Foi por causa dessa minha impressão que achei ainda mais estranha a informação de que o rei homenageado tinha medo de feitiçarias.

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